Os
tristes episódios da recente crise no Oriente Médio e que envolvem, desta vez,
Israel e o Líbano, nos remete a uma pergunta sempre pertinente: por que tanta
guerra na região?
Qualquer pessoa que se dedique a entender os
motivos desses conflitos, deve jogar a âncora da compreensão ao passado,
considerando que as razões para os desentendimentos presentes são uma
conseqüência direta do pós-Primeira Guerra Mundial, logo, das intervenções das
potências que rearranjaram a ordem geopolítica regional de acordo com seus
interesses, particularmente, o Reino Unido. Questões ainda mal resolvidas dessa
época dão a tônica dos problemas atuais.
Contudo, no caso específico desta
crise que envolve os vizinhos Israel e Líbano, podemos empreender um resgate
histórico mais modesto, tentando desmistificar.
Em 1982, Israel, tendo a frente o
ministro da Defesa, Ariel Sharon, invadiu o Líbano para expulsar a OLP
(Organização pela Libertação da Palestina). A organização palestina tinha
naquele país, sua base principal. Derrotada, migrou para a Tunísia.
O Líbano vinha de uma guerra civil
que se iniciara em 1975 e só terminaria em 1991. Essa guerra civil envolvia uma
complexa teia religiosa: cristãos ortodoxos, maronitas, muçulmanos sunitas,
xiitas e drusos. Nesse mosaico cultural, a Síria posicionou-se, inicialmente,
ao lado dos muçulmanos, estendendo sua influência no país para de lá somente se
retirar em 2005. Israel fez o mesmo, mas apoiando o lado cristão da guerra.
Ao interferir na guerra para lhe
cuidar da parte que lhe cabia (expulsar os palestinos que faziam incursões ao
território israelense) Israel criou uma "faixa de segurança" no sul
do Líbano, de lá só se retirando em 2000.
Acontece que a presença isrelense no
sul, fez surgir uma resistência - a partir da vertente xiita - que logo se
converteu em um importante grupo armado, financiado pelo Irã e apoiado pela
Síria: o Hezbolá.
O Hezbolá ampliou seu raio de ação
se convertendo em uma forma de Estado paralelo, com forte atuação assistencial
aos muçulmanos, oferecendo-lhes, escolas, creches, hospitais, entre outras
necessidades elementares que a população local não dispunha. Ganhou notoriedade
entre a população xiita, palestina e libanesa, se transformando em partido
político; atualmente representa 10% do parlamento libanês.
Apesar da retirada israelense em
2000, as incursões de guerrilheiros do Hezbolá ao território israelense, a
partir do sul do Líbano, não cessaram, pois a causa do Hezbolá - assim como do
Hamas, da Jihad Islâmica e de tantos outros grupos fundamentalistas muçulmanos
(inclusive, a al Qaeda) - é bem maior e passa pela não aceitação do Estado de
Israel no Oriente Médio, esse "corpo estranho judeu" no mundo árabe,
segundo a leitura da maior parte da população local.
A "guerra" de 2006
No dia 12 de julho deste ano, Israel invadiu o
espaço aéreo libanês e atacou bases do Hezbolá, iniciando o atual conflito. A
razão das aspas deste subtítulo se deve ao fato de que guerra ocorre entre
Estados, e não é o que está acontecendo (pelo menos, até o momento em que esse
texto foi escrito). O que se tem até agora, é o ataque de um Estado (Israel) a
uma organização rotulada como "terrorista", mas que atua dentro de um
país soberano, no caso, o frágil Líbano.
Na região fronteiriça Israel-Líbano,
seqüestro de parte a parte é cena comum. O fato novo é o extremo rigor
israelense na retaliação a ação do Hezbolá. A energia demasiada vitimou
inocentes, muitas crianças, inclusive; os episódios de Qana chocaram o mundo;
60 civis mortos, entre eles, 36 crianças. Ao contrário do que esperava o Estado
judeu, as ações israelenses só fizeram aumentar o prestígio que o xiita Hezbolá
goza no Líbano, agora expandido para todo o mundo muçulmano. É bom ressaltar
que nesse mundo muçulmano, a maioria é sunita, mas isto parece estar em segundo
plano quando a questão é com Israel. Indiscutivelmente, outro tiro que sai pela
culatra, diz respeito à população judaica dispersa pelo mundo, em
constrangedora e delicada situação no momento, devido às ações do governo
Olmert.
O argumento israelense é a
destruição de um grupo terrorista que estaria agindo em conluio com o regime
iraniano, em uma "conexão xiita." Do ponto de vista da percepção
estratégica, Israel pode até ter razão quanto às intenções de Nasrrallah (líder
do Hezbollá), Ahmadinejad (presidente do Irã) e mesmo do sunita Hassad
(presidente da Síria). Contudo, o peso da mão israelense no trato da questão
pode render uma perigosa ampliação do conflito. Mesmo sendo a maior potência
militar do Oriente Médio, o custo da ação israelense, pode ser caro demais.
Edilson Adão C. Silva é coordenador do Cursinho da
Poli e autor do livro, Oriente Médio: a gênese das fronteiras
Fonte: Cursinho da Poli
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